Desenho em fluxo de consciência.

 É um pouco esquisita a sensação de gostar do que machuca. O limite entre o prazer e a dor já é esquisito normalmente e a coisa toda complica um pouco mais quando se é um pouco sádico. Não é todo mundo que sabe, mas o que eu não tenho de visão do presente no meu olho esquerdo eu tenho de visão no futuro. Presente de Apolo. 

Passei um tempo muito maior do que gostaria de admitir em pânico. Saber do futuro não é tarefa simples, aprendi a duras penas que é impossível segurar o tempo com as mãos e descobri que o único motivo de evitar algum fim é mudar de caminho. Não enxergo o fim do caminho em que ando e isso me deixa menos maluco. Ver o futuro é uma mistura bastante esquisita de dom com maldição, talvez todas as coisas sejam. 

Deslocar o olhar não é uma habilidade muito difícil. A verdade é que fazer mágica não é muito complicado, só tá fora de moda no capitalismo tardio. Um pouco ruim quando a sua principal habilidade é mágica. Nada de mais se você não liga muito pra isso. Aprendi a encantar desde cedo e empreendo um esforço profundo pra não encantar sempre que posso. Não gosto de me encantar também, sempre que faço me arrependo, fiz duas vezes só.

Tenho experimentado bastante com o desenho e tenho desenhado bastante coisa de trabalho também. Tenho pensado em parar de trabalhar com desenho. Não acho que escrevi isso aqui mas voltei pro interior faz um tempo e tô mais em forma do que nunca. Tenho lido o capital também e feito yoga e exercícios quase todos os dias. Não sei, cansei de não fazer tudo o que posso pra me transformar na pessoa maneira que eu sempre quis ser. Já faz um bom tempo que venho me esforçando, tô a um bom tempo em análise, o yoga eu comecei a uns dois ou três anos e as leituras fazem parte de um longo processo de formação intelectual que venho fazendo sozinho também já a um bom tempo. 

Vivi o suficiente pra saber que a única coisa que preciso fazer pra ser bom no que quero ser bom é fazer isso até ficar bom. Foi assim com o desenho.

Dia desses olhei pra uma das páginas de um livro de poesia que tô ilustrando e pensei comigo que qualquer um pode não gostar do que eu faço mas que ninguém pode dizer que eu não sei o que eu tô fazendo. Não gostar do que eu faço é não gostar das minhas escolhas porque a essa altura do campeonato eu sou capaz de afirmar que pelo menos no desenho a minha execução normalmente corre entre boa e ótima. Meu olho esquerdo me diz que seguindo nesse ritmo, talvez em uns cinco ou seis anos eu consiga tirar da cartola umas paradas no pique do que o Kim Jung-Gi fazia.

Não consigo muito ver outras partes do meu futuro. Eu também enxergo intenções e essa é uma das coisas mais duras de ver pra mim. As vezes sinto como se enxergasse por de baixo dos panos e chorei copiosamente dia desses de frente com uma mentira. Prometi pra mim mesmo nunca mais deixar a minha versão mentirosa pilotar a minha cabeça. Nem que me peçam, nem por alguém que eu goste muito. Daqui pra frente apenas o Jaquinho agressivamente honesto escolhe as minhas palavras. 











































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