O Fundo do Poço da Clarice Falcão tocando em loop na minha cabeça.
Tenho feito coisa pra caramba nos últimos tempos e tenho conseguido ver isso com mais clareza também. Tenho me entendido e me cuidado melhor. Aos poucos começado a habitar ao invés de tentar controlar o corpo e a mente. Soltei completamente o medo irracional que sentia de ser esquisito e tenho aceitado melhor o fato de que não me encaixo mesmo em todos os espaços. Aceitei que a única pessoa que precisa mesmo acreditar em mim sou eu mesmo e agora me divirto ao perceber os olhares de quem duvida.
Mariana declamou esses dias um trecho do Jardim das Cerejeiras que ela gosta muito onde um sujeito reclama dos intelectuais que não fazem nada. Tendo visto algumas práticas sem qualquer contrapeso intelectual e tenho pensado bastante sobre a ideia de práxis. Cada vez mais sinto que não tem nada mais frágil do que pensar sem fazer e fazer sem pensar. Infelizmente as vezes penso tanto que me machuca.
Dia desses me perdi numa ideia errada e sentia como se vermes e pássaros devorassem incessantemente as entranhas do meu crânio enquanto elas se regeneravam. Deve ser uma merda ser o Prometeu. Respirei fundo, desliguei a mente e dormi.
Sou um grande fã dos mágicos de todas as nações e por muito tempo me recusei a mexer com mágica, não me sentia preparado pras consequências até o momento em que sofri as consequências de deixar a magia de lado e frente a elas, acho que não existe nenhum risco que eu não tope correr. Afio os olhos com Oxóssi, a língua com Exu, a mente com Buda, o coração com Afrodite e o Espírito com Zeus. Escrevo runas, profiro encantamentos e rasgo e reorganizo a realidade dentro das minhas capacidades. Me transformo aos poucos em mim mesmo.
Me encontro em trechos de livros, em pedaços de falas, em olhares alheios, no chão em que piso e no vento que me sopra. Me recolho e me assimilo sempre que me encontro, penso em quem quero ser e me esforço pra me tornar. Sou exatamente o que acontece com uma pessoa quando ela vive do jeito que vivo e por gostar de como vivo gosto de mim. Não foi fácil chegar até aqui.
Passei anos da minha vida me odiando e me impedindo de ser quem sou. As vezes por medo, as vezes por vergonha, as vezes por covardia. Me convenci de que nunca seria forte e passei anos sem me exercitar, acreditei que nunca aprenderia e passei anos sem ler, aceitei que seria abandonado e me abandonei. Passei muito tempo muito perto do fundo do poço e precisei que alguém me empurrasse pra chegar lá de verdade.
No fundo do poço a água é fria, a queda machuca, a luz quase não chega e sair as vezes parece impossível. Demorou, mas a dor diminuiu e eu acostumei com a temperatura. Minhas pupilas dilatam com facilidade e tendo espaço pra me concentrar em todas essas coisas. Sem mais nada me pinicando na mente fui encontrando aos poucos maneiras de subir.
Tropecei algumas vezes no percurso, acho que ainda vou tropeçar muitas outras. Mas agora, quando sinto o fundo do poço sinto as paredes, a dor e a água como antigos companheiros. Já estive aqui antes e já saí daqui uma vez, sou capaz de fazer isso de novo.
Ilustrei o livro de poesias da Gêminy no começo ano. Ficam aqui alguns dos meus trechos preferidos, quem quiser adquirir o livro é só falar com ela ou esperar o momento em que eu vou rifar algumas das minhas cópias. Mas não sei quando isso vai acontecer.
*Esse projeto foi viabilizado com recursos da Lei Paulo Gustavo de 2023 do município de Barra Velha - SC. Ministério da cultura e essa ladaia, acho importante constar.
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